quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

TARCÍSIO - D. Marcos Barbosa

Na escuridão, 
Pequeno vulto. 
- Que leva oculto 
No coração?
Logo outro vulto, 
Também oculto, 
O vai seguindo 
Na escuridão. 
E vai pensando: 
- Que leva ele, 
Que leva oculto 
No coração? 
Já outro vulto 
Ao que seguia 
Veio juntar-se 
Na escuridão. 
- Que leva oculto 
(Os dois se dizem), 
Que leva oculto 
No coração? 
Já outro e outro 
Qual procissão, 
Seguem Tarcísio 
Na escuridão... 
- Na aurora agora, 
Não mais oculto 
Que levas (dize!), 
Pequeno vulto? 
Vulto calado, 
Vulto embuçado, 
Que não responde, 
Mas algo esconde 
No coração... 
- Leva um tesouro? 
Leva um poema? 
Uma invenção... 
E atrás o seguem, 
Atrás prosseguem, 
Atrás perseguem 
Os outros vultos.
- Será leiteiro, 
Será padeiro, 
Ágil menino 
Tão de manhã?! 
Ah! se não falas, 
Ah, se te calas, 
As próprias pedras 
Irão gritar... 
Não vês acaso 
Os que te seguem 
Algo apanhando 
No rude chão? 
Que levas (dize, 
Ah! dize logo!) 
Tão em segredo 
No coração? 
Todo calado, 
Todo enbuçado, 
Vai o menino 
Na solidão. 
Parte a primeira, 
Parte a segunda, 
Terceira pedra 
O vem prostrar! 
Mesmo caído, 
Até ferido, 
Tu te obstinas 
Em não falar! 
Pequeno vulto, 
Agora oculto 
Por sobre as pedras 
(Tantas lamçaram!). 
Ninguém queria 
Fazer-te mal... 
É sempre assim, 
Irrefletida, 
Cega, incontida, 
A multidão. 
Por que não disseste 
O que levavas, 
O que levavas 
No coração? 
(O que levavas 
Leva-te agora 
Em plena aurora, 
Em pleno dia...) 
Tiram as pedras, 
Vão procurando, 
Vão pesquisando 
Na confusão. 
- Onde o poema, 
Onde o tesouro, 
Onde a invenção? 
Que ele levava, 
Que ele ocultava 
No coração? 
Mas nada encontraram. 
Pois sob as pedras, 
Por sobre o pó, 
Tão esmagados, 
Grãos triturados, 
Tarcísio e Cristo 
Já são um só!

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