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quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

ESTAMPA DA PRIMEIRA MISSA - Murilo Araújo

Na terra amanhecida
entre as ondas a rir jubilosas de luz
e as árvores em flor, se ergue a árvore da Vida –
A Cruz.
Entre os tupis a marujada ajoelha.
Uma legião de beija-flores passarinha.

Então “no ilhéu chamado a Coroa Vermelha”
O Frei Henrique de Coimbra se aparelha
e em paramentos de ouro beija o altar…

A alma argentina de uma campainha
se une aos gorjeios da manhã solar...

Junto aos altos pendões do palmar nunca visto
treme um pendão mais alto, o estandarte de Cristo.

Longe um som de clarim morre em glória no ar.

As resinas do mato, onde em onde,
erguem incenso
turibulando pelos troncos bons.
Frei Henrique celebra e é Deus quem lhe responde
na voz do oceano, seu harmônio imenso,
rolando ao longe um turbilhão de sons.

As campânulas trêmulas nos galhos
tilintam à brisa
sua matina aos pingos dos orvalhos;
e a várzea que se irisa
oferenda ao Senhor
nas passifloras roxas os martírios
e na água em sono as ânforas dos lírios…
Há um repousório em cada moita em flor.

São candelabros de ouro os ipês flamejantes!
E ascenderam ao sol corolas delirantes
como se fossem círios
em louvor.

Quando a hóstia se eleva angelical
sobe com ela o sol no firmamento.

As borboletas – que deslumbramento! –
com os tucanos e arás de tom violento
pintam no azul policromias de vitral…
Canta a araponga na floresta longa
como um sino a tanger, dominical...

As naus florem de branco o deserto marinho,
Lembram virgens trazendo, em túnicas de linho,
na alva das velas uma cruz cristã;
e a patena do sol as consagrou com o vinho
aéreo da manhã.

Oh hora ingênua da Fé! Oh primeiro evangelho!
Pero Vaz escreveu que “um índio já bem velho
apontou para a cruz…” Oh gesto anunciador!

Cabral e os que domaram os sete mares
Unem as mãos tremendo de fervor.

E na luz recém-vinda
em bênçãos tutelares,
a terra em flor se alegra em jubileu…
“a terra graciosa” e tão nova e tão linda! –
a terra desde então desposada de Deus.

terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

HISTÓRIA CRISTÃ - Murilo Araújo

Natal.
Missa do galo assistida de estrelas.

E à meia-noite havia tanta glória
na grande catedral,
que o Menino Jesus que não ama a riqueza
no retábulo de ouro onde estava, no altar
moveu os bracinhos, sério,
e começou no berço a gritar e a chorar!
Logo, para acalmá-lo,
o sacerdote em vão o embalou nos joelhos
e mostrou-lhe no alto as lâmpadas da festa
a tremer e a brilhar…

Acenderam-se em vão mais cristais com espelhos.
O Menino Jesus continuou a chorar.

Embalde o órgão gemeu cantilenas serenas
de adormecer, de acalentar;
Em vão mais docemente entoaram os hossanas.
Mais incenso! Mais rosas!
E o Menino Jesus a chorar, a chorar…

Cem senhoras do escol,
com perfumes e jóias e sorrisos em flor,
o tomaram nas mãos.
Cem mantos de veludo em vão o aconchegaram
em cem colos cristãos.

E o arcebispo até de dalmática real
agitou de mansinho aos olhos do Menino
dez campainhas – dez! – todas em matinada
a tocar:
tilim-tim! Tilim-tim…

Nada, nada;
Jesus… continuou a chorar.

Então uma preta humilde, uma preta descalça,
de pixaim branquinho, a tomá-lo se ergueu;
afagou-o a tremer com ingénua doçura,
maternalmente o repreendeu:
“Vem drumi, vem drumi, Sinhô moço!”

E, oh milagre!
O Menino Jesus sorriu e adormeceu.