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terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

ACALANTO DE JOHN TALBOT - Manuel Bandeira

Dorme, meu filhinho,
Dorme sossegado.
Dorme, que a teu lado
Cantarei baixinho.
O dia não tarda...
Vai amanhecer:
Como é frio o ar!
O anjinho da guarda
Que o Senhor te deu,
Pode adormecer,
Pode descansar,
Que te guardo eu.

IRENE NO CÉU - Manuel Bandeira


Irene preta
Irene boa
Irene sempre de bom humor.

Imagino Irene entrando no céu:
- Licença, meu branco!
E São Pedro, bonachão:
- Entra, Irene. Você não precisa pedir licença.

À SUA SANTIDADE PAULO VI - Manuel Bandeira


Quando em torno de nós raiva o funesto
Desvario, e na infernal perplexidade
Erramos o caminho da verdade
Nos Santos Evangelhos manifesto,

Baixem as luzes do divino Texto
Pela boca de Vossa Santidade
Para reconduzir a cristandade
Ao aprisco do Pai, ó Paulo VI!

Nest'hora em que de cada continente
Vêm mil gemidos e incessantemente
Em sangue humano o duro chão se empapa,

Falai, falai, que ouvir a vossa isenta
Palavra é ouvir em meio da tormenta
A voz de Deus na voz de um grande Papa.

ORAÇÃO PARA AVIADORES - Manuel Bandeira


Santa Clara, clareai
Estes ares.
Dai-nos ventos regulares,
De feição.
Este mares, estes ares
Clareai.

Santa Clara, dai-nos sol.
Se baixar a cerração,
Alumiai
Meus olhos na cerração.
Estes montes e horizontes
Clareai.

Santa Clara, no mau tempo
Sustentai
Nossas asas.
A salvo de árvores, casas
E penedos, nossas asas
Governai.

Santa Clara, clareai.
Afastai
Todo risco.
Por amor de S. Francisco,
Vosso mestre, nosso pai,
Santa Clara, todo risco
Dissipai.

Santa Clara, clareai.

O MENINO DOENTE - Manuel Bandeira


O menino dorme.

Para que o menino
Durma sossegaddo,
Sentado a seu lado
A mãezinha canta:

- "Dodói, vai-te embora!
"Deixa o meu filhinho.
"Dorme... dorme... meu..."

Morta de fadiga,
Ela adormeceu.

Então, no ombro dela,
Um vulto de santa,
Na mesma cantiga,
Na mesma voz dela,
Se debruça e canta:

-"Dorme, meu amor.
"Domre, meu benzinho..."

E o menino dorme.

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

A ANUNCIAÇÃO - Manuel Bandeira


Seis meses passados sobre
A angélica anunciação
Do nascimento de João, Santo filho de Isabel,
Baixou o arcanjo Gabriel
À Galiléia e na casa
Do carpinteiro José
Entrou e diante da virgem
Desposada com o varão
- Maria ela se chamava -
Curvou-se em genuflexão.
Dizendo com voz suave
Mais que a aura da manhã: "Ave,
Maria cheia de graça!
Nosso Senhor é contigo,
Tu bendita entre as mulheres".
E ela, vendo-o assim, turbou-se
Muito de suas palavras.
Mas o anjo, tranquilizando-a,
Falou: "Maria, não temas:
Deus escolheu-te, a mais pura
Entre todas as mulheres,
Para um filho conceberes
No teu ventre e, dado à luz,
O chamarás de Jesus;
O santo Deus fá-lo-á grande,
Dar-lhe-á o trono de Davi,
Seu reino não terá fim".
E disse Maria ao anjo:
"Como pode ser assim,
Se não conheço varão?"
E, respondendo o anjo, disse-lhe:
"Descerá sobre ti o Espírito
Santo e a virtude do Altíssimo
Te cobrirá com sua sombra;
Pelo que também o Santo
Que de ti há de nascer,
Filho de Deus terá nome,
Com ser filho de mulher,
Pois tua prima Isabel
Não concebeu na velhice,
Sendo estéril? A Deus nada
É impossível". O anjo disse
E afastou-se de Maria.
Como no extremo horizonte
A primeira, desmaiada
Celagem da madrugada,
Duas rosas transluziram
Nas faces da Virgem pura:
Já era Jesus no seu sangue,
Antes de, infinito Espírito
Mudado em corpo finito,
Se fixar em forma humana
na matriz santificada.

O CRUCIFIXO - Manuel Bandeira


É um crucifixo de marfim
Ligeiramente amarelado,
Pátina do tempo escoado.
Sempre o vi patinado assim.

Mãe, irmã, pai meus estreitado
Tiveram-no ao chegar o fim.
Hoje, em meu quarto colocado,
Ei-lo velando sobre mim.

E quando se cumprir aquele
Instante, que tardando vai,
De eu deixar esta vida, quero

Morrer agarrado com ele.
Talvez me salve. Como - espero -
Minha mãe, minha irmã, meu pai.

CANTO DE NATAL - Manuel Bandeira


O nosso menino
Nasceu em Belém.
Nasceu tão-somente
Para querer bem.

Nasceu sobre as palhas
O nosso menino.
Mas a mãe sabia
Que ele era divino.

Vem para sofrer
A morte na cruz,
O nosso menino.
Seu nome é Jesus.

Por nós ele aceita
O humano destino:
Louvemos a glória
De Jesus menino.

PROGRAMA PARA DEPOIS DE MINHA MORTE - Manuel Bandeira

... esta outra vida de aquém-túmulo.
Guimarães Rosa



Depois de morto, quando eu chegar ao outro mundo,
Primeiro quererei beijar meus pais, meus irmãos, meus avós, meus tios, meus primos.
Depois irei abraçar longamente uns amigos -
Vasconcelos. Ovalle, Mário...
Gostaria ainda de me avistar com o santo Francisco de Assis.
Mas quem sou eu? Não mereço.
Isto feito, me abismarei na contemplação de Deus e de sua glória
Esquecido para sempre de todas as delícias, dores, perplexidades
Desta outra vida de aquém-túmulo.

UBIQUIDADE - Manuel Bandeira

Estás em tudo que penso,
Estás em quanto imagino:
Estás no horizonte imenso,
Estás no grão pequenino.

Estás na ovelha que pasce,
Estás no rio que corre:
Estás em tudo que nasce,
Estás em tudo que morre.

Em tudo estás, nem repousas,
Ó ser tão mesmo e diverso!
(Eras no início das cousas,
Serás no fim do universo.)

Estás na alma e nos sentidos.
Estás no espírito, estás
Na letra, e, os tempos cumpridos,
No céu, nos céu estarás.