Por uma estrada de astros e perfumes
A Santa Virgem veio ter comigo:
Doiravam-lhe o cabelo claros lumes
Do sacrossanto resplendor antigo.
Dos olhos divinais no doce abrigo
Não tinha laivos de Paixões e ciúmes:
Domadora do Mal e do perigo
Da montanha da Fe galgara os cumes.
Vestida na alva excelsa dos Profetas
Falou na ideal resignação de Ascetas,
Que a febre dos desejos aquebranta.
No entanto os olhos d'Ela vacilavam,
Pelo mistério, pela dor flutuavam,
Vagos e tristes, apesar de Santa!
quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011
SONETO - Alphonsus de Guimaraens
Deus é a luz celestial que os astros unge e veste,
E dessa eterna luz nós todos fomos feitos.
Um fulgor de orações brilha nos nossos peitos:
É o reflexo estelar dessa origem celeste.
O homem mais louco e vil, cuja alma ímpia se creste
Aos fogos infernais dos mais torpes defeitos,
De vez em quando sente esplendores eleitos,
Que tombam nele como o luar sobre um cipreste.
Quem não sentiu no peito a carícia divina,
A enchê-lo de clarões na transparência hialina
De um astro que cintila em pleno azul sem véus?
Tudo é luz na nossa alma, e o mais vil, o mais louco,
Bem sabe que esta vida é um sol que dura pouco
E que Deus vive em nós como dentro dos céus...
E dessa eterna luz nós todos fomos feitos.
Um fulgor de orações brilha nos nossos peitos:
É o reflexo estelar dessa origem celeste.
O homem mais louco e vil, cuja alma ímpia se creste
Aos fogos infernais dos mais torpes defeitos,
De vez em quando sente esplendores eleitos,
Que tombam nele como o luar sobre um cipreste.
Quem não sentiu no peito a carícia divina,
A enchê-lo de clarões na transparência hialina
De um astro que cintila em pleno azul sem véus?
Tudo é luz na nossa alma, e o mais vil, o mais louco,
Bem sabe que esta vida é um sol que dura pouco
E que Deus vive em nós como dentro dos céus...
SONETO - Alphonsus de Guimaraens
Junto da Cruz, em pé, Maria estava,
e perto dela, João. Jesusm que os via,
Para os dois entes celestiais olhava,
Olhos saudosos de melancolia.
- "Eis teu filho, Mulher". E João chorava.
E a mesma voz dulcíssima dizia
Ao discípulo que Jesus amava:
- "Eis tua mãe." Pouco depois morria.
Sobre-humanas delícias nunca vistas
Vieram, brancas, beijar a Alma tão pura
Do mais suave dos Quatro Evangelistas,
Meigo S. João! fado de glórias pôs-te
A mão de Deus: que é a maior ventura
Ser amado de Cristo como foste.
e perto dela, João. Jesusm que os via,
Para os dois entes celestiais olhava,
Olhos saudosos de melancolia.
- "Eis teu filho, Mulher". E João chorava.
E a mesma voz dulcíssima dizia
Ao discípulo que Jesus amava:
- "Eis tua mãe." Pouco depois morria.
Sobre-humanas delícias nunca vistas
Vieram, brancas, beijar a Alma tão pura
Do mais suave dos Quatro Evangelistas,
Meigo S. João! fado de glórias pôs-te
A mão de Deus: que é a maior ventura
Ser amado de Cristo como foste.
MÃOS (SONETO) - Alphonsus de Guimaraens
Mãos que os lírios invejam, mãos eleitas
Para aliviar de Cristo os sofrimentos,
Cujas veias azuis parecem feitas
Da mesma essência astral dos olhos bentos;
Mãos de sonho e de crença, mãos afeitas
A guiar do moribundo os passos lentos,
E em séculos de fé, rosas desfeitas
Em hinos sobre as torres dos conventos;
Mãos a bordar o santo Escapulário,
Que revelastes, para quem padece,
O inefável consolo do Rosário;
Mãos ungidas no sangue da Coroa,
Deixai tombar sobre minh’ alma em prece
A benção que redime e que perdoa!
Para aliviar de Cristo os sofrimentos,
Cujas veias azuis parecem feitas
Da mesma essência astral dos olhos bentos;
Mãos de sonho e de crença, mãos afeitas
A guiar do moribundo os passos lentos,
E em séculos de fé, rosas desfeitas
Em hinos sobre as torres dos conventos;
Mãos a bordar o santo Escapulário,
Que revelastes, para quem padece,
O inefável consolo do Rosário;
Mãos ungidas no sangue da Coroa,
Deixai tombar sobre minh’ alma em prece
A benção que redime e que perdoa!
CONTENTAMENTO - Ribeiro Couto
Este ar tranquilo que me envolve,
A mansidão que me penetra,
Na noite fluida, transparente,
É tudo quanto eu desejava.
Que mais me falta, Deus louvado?
A lua vem, entre as ramagens
Do jardim que dorme na sombra,
Fazer-me suave companhia.
Esta doçura esparsa em tudo
(Que noite para amar a vida!)
Bem sei porque me põe num êxtase
É a esmola anônima do céu
Para a minha alma de homem grata.
Meu Senhor, minha boca é pobre
Para dizer toda a verdade,
Tudo que sobe do meu peito.
Meu Senhor, à minha família
Dá sempre saúde e paciência;
Aos meus amigos dá fortuna;
E ao mais indigno dos teus filhos
Este humilde contentamento.
A mansidão que me penetra,
Na noite fluida, transparente,
É tudo quanto eu desejava.
Que mais me falta, Deus louvado?
A lua vem, entre as ramagens
Do jardim que dorme na sombra,
Fazer-me suave companhia.
Esta doçura esparsa em tudo
(Que noite para amar a vida!)
Bem sei porque me põe num êxtase
É a esmola anônima do céu
Para a minha alma de homem grata.
Meu Senhor, minha boca é pobre
Para dizer toda a verdade,
Tudo que sobe do meu peito.
Meu Senhor, à minha família
Dá sempre saúde e paciência;
Aos meus amigos dá fortuna;
E ao mais indigno dos teus filhos
Este humilde contentamento.
PEQUENA IGREJA - Augusto Frederico Schmidt
Eu queria louvar-te, pequena e humilde igreja
Desta cidadezinha que está morrendo.
Eu queria agradecer-te a compreensão que me deste
Das coisas humildes e eternas.
Eu queria saber cantar a tua tranqüilidade
E a tua pura beleza,
Ó igreja da roça, adormecida diante do jardim cheio de rosas!
Ó pequena casa de Jesus Cristo, irmã das outras casas solenes e graves,
Escondida e modesta, com as tuas torres e os teus sinos
Que sabem encher o ar matinal com um tão doce apelo,
E no instante vesperal lembram que é hora de dormir para a grande família dos passarinhos inquietos,
Dos passarinhos que tumultuam o pobre jardim cheio de flores!
ESTAMPA DA PRIMEIRA MISSA - Murilo Araújo
Na terra amanhecida
entre as ondas a rir jubilosas de luz
e as árvores em flor, se ergue a árvore da Vida –
A Cruz.
Entre os tupis a marujada ajoelha.
Uma legião de beija-flores passarinha.
Então “no ilhéu chamado a Coroa Vermelha”
O Frei Henrique de Coimbra se aparelha
e em paramentos de ouro beija o altar…
A alma argentina de uma campainha
se une aos gorjeios da manhã solar...
Junto aos altos pendões do palmar nunca visto
treme um pendão mais alto, o estandarte de Cristo.
Longe um som de clarim morre em glória no ar.
As resinas do mato, onde em onde,
erguem incenso
turibulando pelos troncos bons.
Frei Henrique celebra e é Deus quem lhe responde
na voz do oceano, seu harmônio imenso,
rolando ao longe um turbilhão de sons.
As campânulas trêmulas nos galhos
tilintam à brisa
sua matina aos pingos dos orvalhos;
e a várzea que se irisa
oferenda ao Senhor
nas passifloras roxas os martírios
e na água em sono as ânforas dos lírios…
Há um repousório em cada moita em flor.
São candelabros de ouro os ipês flamejantes!
E ascenderam ao sol corolas delirantes
como se fossem círios
em louvor.
Quando a hóstia se eleva angelical
sobe com ela o sol no firmamento.
As borboletas – que deslumbramento! –
com os tucanos e arás de tom violento
pintam no azul policromias de vitral…
Canta a araponga na floresta longa
como um sino a tanger, dominical...
As naus florem de branco o deserto marinho,
Lembram virgens trazendo, em túnicas de linho,
na alva das velas uma cruz cristã;
e a patena do sol as consagrou com o vinho
aéreo da manhã.
Oh hora ingênua da Fé! Oh primeiro evangelho!
Pero Vaz escreveu que “um índio já bem velho
apontou para a cruz…” Oh gesto anunciador!
Cabral e os que domaram os sete mares
Unem as mãos tremendo de fervor.
E na luz recém-vinda
em bênçãos tutelares,
a terra em flor se alegra em jubileu…
“a terra graciosa” e tão nova e tão linda! –
a terra desde então desposada de Deus.
entre as ondas a rir jubilosas de luz
e as árvores em flor, se ergue a árvore da Vida –
A Cruz.
Entre os tupis a marujada ajoelha.
Uma legião de beija-flores passarinha.
Então “no ilhéu chamado a Coroa Vermelha”
O Frei Henrique de Coimbra se aparelha
e em paramentos de ouro beija o altar…
A alma argentina de uma campainha
se une aos gorjeios da manhã solar...
Junto aos altos pendões do palmar nunca visto
treme um pendão mais alto, o estandarte de Cristo.
Longe um som de clarim morre em glória no ar.
As resinas do mato, onde em onde,
erguem incenso
turibulando pelos troncos bons.
Frei Henrique celebra e é Deus quem lhe responde
na voz do oceano, seu harmônio imenso,
rolando ao longe um turbilhão de sons.
As campânulas trêmulas nos galhos
tilintam à brisa
sua matina aos pingos dos orvalhos;
e a várzea que se irisa
oferenda ao Senhor
nas passifloras roxas os martírios
e na água em sono as ânforas dos lírios…
Há um repousório em cada moita em flor.
São candelabros de ouro os ipês flamejantes!
E ascenderam ao sol corolas delirantes
como se fossem círios
em louvor.
Quando a hóstia se eleva angelical
sobe com ela o sol no firmamento.
As borboletas – que deslumbramento! –
com os tucanos e arás de tom violento
pintam no azul policromias de vitral…
Canta a araponga na floresta longa
como um sino a tanger, dominical...
As naus florem de branco o deserto marinho,
Lembram virgens trazendo, em túnicas de linho,
na alva das velas uma cruz cristã;
e a patena do sol as consagrou com o vinho
aéreo da manhã.
Oh hora ingênua da Fé! Oh primeiro evangelho!
Pero Vaz escreveu que “um índio já bem velho
apontou para a cruz…” Oh gesto anunciador!
Cabral e os que domaram os sete mares
Unem as mãos tremendo de fervor.
E na luz recém-vinda
em bênçãos tutelares,
a terra em flor se alegra em jubileu…
“a terra graciosa” e tão nova e tão linda! –
a terra desde então desposada de Deus.
TARCÍSIO - D. Marcos Barbosa
Na escuridão,
Pequeno vulto.
- Que leva oculto
No coração?
Logo outro vulto,
Também oculto,
O vai seguindo
Na escuridão.
E vai pensando:
- Que leva ele,
Que leva oculto
No coração?
Já outro vulto
Ao que seguia
Veio juntar-se
Na escuridão.
- Que leva oculto
(Os dois se dizem),
Que leva oculto
No coração?
Já outro e outro
Qual procissão,
Seguem Tarcísio
Na escuridão...
- Na aurora agora,
Não mais oculto
Que levas (dize!),
Pequeno vulto?
Vulto calado,
Vulto embuçado,
Que não responde,
Mas algo esconde
No coração...
- Leva um tesouro?
Leva um poema?
Uma invenção...
E atrás o seguem,
Atrás prosseguem,
Atrás perseguem
Os outros vultos.
- Será leiteiro,
Será padeiro,
Ágil menino
Tão de manhã?!
Ah! se não falas,
Ah, se te calas,
As próprias pedras
Irão gritar...
Não vês acaso
Os que te seguem
Algo apanhando
No rude chão?
Que levas (dize,
Ah! dize logo!)
Tão em segredo
No coração?
Todo calado,
Todo enbuçado,
Vai o menino
Na solidão.
Parte a primeira,
Parte a segunda,
Terceira pedra
O vem prostrar!
Mesmo caído,
Até ferido,
Tu te obstinas
Em não falar!
Pequeno vulto,
Agora oculto
Por sobre as pedras
(Tantas lamçaram!).
Ninguém queria
Fazer-te mal...
É sempre assim,
Irrefletida,
Cega, incontida,
A multidão.
Por que não disseste
O que levavas,
O que levavas
No coração?
(O que levavas
Leva-te agora
Em plena aurora,
Em pleno dia...)
Tiram as pedras,
Vão procurando,
Vão pesquisando
Na confusão.
- Onde o poema,
Onde o tesouro,
Onde a invenção?
Que ele levava,
Que ele ocultava
No coração?
Mas nada encontraram.
Pois sob as pedras,
Por sobre o pó,
Tão esmagados,
Grãos triturados,
Tarcísio e Cristo
Já são um só!
SANTA MARIA DOS ANJOS - Augusto de Lima
Santa Maria dos Anjos
da capelinha florida,
onde floresce o perdão,
dobrando o sino, convida
os descontentes da vida
a vir chorar na oração.
Santa Maria dos Anjos,
fonte de graças mais puras,
foco do eterno esplendor,
oferece às criaturas,
conforto nas amarguras,
prêmios de glória na dor.
Santa Maria dos Anjos!
lá no recinto se ouvia,
um coro de anjos cantar.
Cantavam: “Santa Maria...”
enquanto Francisco via
aberto o céu sobre o altar.
Santa Maria dos Anjos
a capelinha plantara
em terra santa e feliz.
Foi nela que a loura seara
da cabeleira de Clara
colheu Francisco de Assis.
Santa Maria dos Anjos
fez do seu templo um abrigo,
do seu jardim um trigal;
trigal do divino trigo;
que afasta o eterno castigo
e leva à vida imortal.
Santa Maria dos Anjos,
Mãe de Deus, Nossa Senhora,
da Porciúncula alma e luz;
sê do poeta inspiradora,
embebe-lhe o estro na aurora,
do doce olhar de Jesus.
Santa Maria dos Anjos,
Mãe de Deus, Nossa Senhora
e Mãe dos homens também,
perdão aos Senhor implora
dos pecadores, agora
e na hora da morte. Amém.
da capelinha florida,
onde floresce o perdão,
dobrando o sino, convida
os descontentes da vida
a vir chorar na oração.
Santa Maria dos Anjos,
fonte de graças mais puras,
foco do eterno esplendor,
oferece às criaturas,
conforto nas amarguras,
prêmios de glória na dor.
Santa Maria dos Anjos!
lá no recinto se ouvia,
um coro de anjos cantar.
Cantavam: “Santa Maria...”
enquanto Francisco via
aberto o céu sobre o altar.
Santa Maria dos Anjos
a capelinha plantara
em terra santa e feliz.
Foi nela que a loura seara
da cabeleira de Clara
colheu Francisco de Assis.
Santa Maria dos Anjos
fez do seu templo um abrigo,
do seu jardim um trigal;
trigal do divino trigo;
que afasta o eterno castigo
e leva à vida imortal.
Santa Maria dos Anjos,
Mãe de Deus, Nossa Senhora,
da Porciúncula alma e luz;
sê do poeta inspiradora,
embebe-lhe o estro na aurora,
do doce olhar de Jesus.
Santa Maria dos Anjos,
Mãe de Deus, Nossa Senhora
e Mãe dos homens também,
perdão aos Senhor implora
dos pecadores, agora
e na hora da morte. Amém.
AS VIRTUDES - Alphonsus de Guimaraens
São três irmãs, são três flores,
feitas de raios de luz.
Plantou-as, entre fulgores,
a mão santa de Jesus.
Uma é a Fé, outra, a Esperança,
vem a Caridade após...
Feliz de quem as alcança!
Vivem sempre junto a nós.
São belas como princesas.
A caridade é, talvez,
neste mundo de incertezas,
a mais formosa das três.
feitas de raios de luz.
Plantou-as, entre fulgores,
a mão santa de Jesus.
Uma é a Fé, outra, a Esperança,
vem a Caridade após...
Feliz de quem as alcança!
Vivem sempre junto a nós.
São belas como princesas.
A caridade é, talvez,
neste mundo de incertezas,
a mais formosa das três.
terça-feira, 8 de fevereiro de 2011
ORAÇÕES - Casimiro de Abreu
A alma, como o incenso, ao céu s’eleva
Da férvida oração nas asas puras,
E Deus recebe como um longo hosana
O cântico de amor das criaturas.
Do trono d’ouro que circundam anjos
Sorrindo ao mundo a Virgem-Mãe s’inclina
Ouvindo as vozes d’inocência bela
Dos lábios virginais duma menina.
Da tarde morta o murmurar se cala
Ante a prece infantil, que sobe e voa
Fresca e serena qual perfume doce
Das frescas rosas de gentil coroa.
As doces falas de tua alma santa
Valem mais do que eu valho oh! querubim!
Quando rezares por teu mano
Não t’esqueças também – reza por mim!
Da férvida oração nas asas puras,
E Deus recebe como um longo hosana
O cântico de amor das criaturas.
Do trono d’ouro que circundam anjos
Sorrindo ao mundo a Virgem-Mãe s’inclina
Ouvindo as vozes d’inocência bela
Dos lábios virginais duma menina.
Da tarde morta o murmurar se cala
Ante a prece infantil, que sobe e voa
Fresca e serena qual perfume doce
Das frescas rosas de gentil coroa.
As doces falas de tua alma santa
Valem mais do que eu valho oh! querubim!
Quando rezares por teu mano
Não t’esqueças também – reza por mim!
ORAÇÃO DA NOITE - Auta de Sousa
Ajoelhada, ó meu Deus, e as duas mãos unidas,
Olhos fitos na Cruz, imploro a tua graça...
Esconde-me, Jesus! da treva que esvoaça
Na tristeza e no horror das noites mal dormidas,
Maria! Virgem mãe das almas compungidas,
Sorriso no prazer, conforto na desgraça...
Recolhe essa oração que nos meus lábios passa
Em palavras de fé no teu amor ungidas.
Anjo de minha guarda, ó doce companheiro!
Tu que levas do berço ao porto derradeiro
O lúrido batel de meu sonhar sem fim,
Dá-me o sono que traz o bálsamo ao tormento,
Afoga o coração no mar do esquecimento...
Abre as asas, meu anjo, e estende-as sobre mim.
Olhos fitos na Cruz, imploro a tua graça...
Esconde-me, Jesus! da treva que esvoaça
Na tristeza e no horror das noites mal dormidas,
Maria! Virgem mãe das almas compungidas,
Sorriso no prazer, conforto na desgraça...
Recolhe essa oração que nos meus lábios passa
Em palavras de fé no teu amor ungidas.
Anjo de minha guarda, ó doce companheiro!
Tu que levas do berço ao porto derradeiro
O lúrido batel de meu sonhar sem fim,
Dá-me o sono que traz o bálsamo ao tormento,
Afoga o coração no mar do esquecimento...
Abre as asas, meu anjo, e estende-as sobre mim.
NATAL - Auta de Sousa
É meia noite ... O sino alvissareiro,
Lá da igrejinha branca pendurado,
Como n’um sonho místico e fagueiro,
Vem relembrar o tempo do passado.
Ó velho sino, ó bronze abençoado,
Na alegria e na mágoa companheiro!
Tu me recordas o sorrir primeiro
De menino Jesus imaculado.
E enquanto escuto a tua voz dolente,
Meu ser que geme dolorosamente
Da desventura, aos gélidos açoites ...
Bebe em teus sons tanta alegria, tanta!
Sino que lembras uma noite santa,
Noite bendita mais que as outras noites!
Lá da igrejinha branca pendurado,
Como n’um sonho místico e fagueiro,
Vem relembrar o tempo do passado.
Ó velho sino, ó bronze abençoado,
Na alegria e na mágoa companheiro!
Tu me recordas o sorrir primeiro
De menino Jesus imaculado.
E enquanto escuto a tua voz dolente,
Meu ser que geme dolorosamente
Da desventura, aos gélidos açoites ...
Bebe em teus sons tanta alegria, tanta!
Sino que lembras uma noite santa,
Noite bendita mais que as outras noites!
JESUS! MARIA! - Auta de Sousa
Meu coração guarda escritos
E canta em doce harmonia
Estes dois nomes benditos:
Jesus! Maria!
Se o dia nasce e, na altura,
O sol formoso irradia,
Minh’alma acorda e murmura:
Jesus! Maria!
Se a noite desce e, tão brando,
O Sonho azul me inebria,
Sempre adormeço cantando:
Jesus! Maria!
Da ilusão se o sopro lindo
Todo o meu ser extasia,
Alegre digo, sorrindo:
Jesus! Maria!
Meu coração, quando pulsa,
Louco de dor e agonia,
Ainda grito convulsa:
Jesus! Maria!
Jesus! Maria! Invocando
Em vós o sol que alumia,
Quero morrer soluçando:
Jesus! Maria!
E canta em doce harmonia
Estes dois nomes benditos:
Jesus! Maria!
Se o dia nasce e, na altura,
O sol formoso irradia,
Minh’alma acorda e murmura:
Jesus! Maria!
Se a noite desce e, tão brando,
O Sonho azul me inebria,
Sempre adormeço cantando:
Jesus! Maria!
Da ilusão se o sopro lindo
Todo o meu ser extasia,
Alegre digo, sorrindo:
Jesus! Maria!
Meu coração, quando pulsa,
Louco de dor e agonia,
Ainda grito convulsa:
Jesus! Maria!
Jesus! Maria! Invocando
Em vós o sol que alumia,
Quero morrer soluçando:
Jesus! Maria!
ADORAÇÃO DOS REIS - Auta de Sousa
Jesus sorri. Que ternura,
Que doce favo de luz
Vejo brilhar na candura
De seus dois olhos azuis!
Chegam os Magos. De joelho,
Cheios de unção e de amor,
Beijam o pesinho vermelho
Do pequenino Senhor.
Trazem-lhe mesmo um tesouro
Lembrando glória e tormento:
Caçoulas de incenso e ouro
É a mirra do sofrimento.
Ó Reis do Grande Oriente,
Por que lembrastes, então,
Á mãe do louro inocente
A dor sem fim da Paixão?
Não vedes que a Virgem chora
Olhando a mirra cruel?
É que ela se lembra agora
Da esponja embebida em fel.
Talvez não vísseis o lindo
Bando gentil de pastores
Que o rodearam sorrindo,
Mas só lhe trouxeram flores!
Que doce favo de luz
Vejo brilhar na candura
De seus dois olhos azuis!
Chegam os Magos. De joelho,
Cheios de unção e de amor,
Beijam o pesinho vermelho
Do pequenino Senhor.
Trazem-lhe mesmo um tesouro
Lembrando glória e tormento:
Caçoulas de incenso e ouro
É a mirra do sofrimento.
Ó Reis do Grande Oriente,
Por que lembrastes, então,
Á mãe do louro inocente
A dor sem fim da Paixão?
Não vedes que a Virgem chora
Olhando a mirra cruel?
É que ela se lembra agora
Da esponja embebida em fel.
Talvez não vísseis o lindo
Bando gentil de pastores
Que o rodearam sorrindo,
Mas só lhe trouxeram flores!
AO SENHOR DO BOMFIM - Auta de Sousa
A Joaquina Felismina da Conceição.
Sofrer ou morrer!
Santa Thereza de Jesus
Amado Senhor,
Meu doce Jesus,
Que morres de amor
Suspenso da Cruz!
Em triste amargura,
Te vendo morrer,
Meu lábio murmura:
Eu quero sofrer!
Sofrer tanto, tanto,
(Senhor, sem cessar!).
Que os olhos, de pranto,
Se arrasem n’um mar.
Tu és meu amigo,
Meu sol, minha luz!
Reparte comigo
O peso da Cruz.
Bem vês quanto choro,
Tem pena de mim!
A Ti só adoro
Senhor do Bomfim.
REGINA MARTYRUM - Auta de Sousa
Lírio do Céu, sagrada criatura,
Mãe das crianças e dos pecadores,
Alma divina como a luz e as flores
Das virgens castas a mais casta e pura;
Do Azul imenso, d’essa imensa altura
Para onde voam nossas grandes dores,
Desce os teus olhos cheios de fulgores
Sobre os meus olhos cheios de amargura!
Na dor sem termo pela negra estrada
Vou caminhando a sós, desatinada,
- Ai! pobre cega sem amparo ou guia! -
Sê tu a mão que me conduza ao porto...
Ó doce mãe da luz e do conforto,
Ilumina o terror d’esta agonia!
Mãe das crianças e dos pecadores,
Alma divina como a luz e as flores
Das virgens castas a mais casta e pura;
Do Azul imenso, d’essa imensa altura
Para onde voam nossas grandes dores,
Desce os teus olhos cheios de fulgores
Sobre os meus olhos cheios de amargura!
Na dor sem termo pela negra estrada
Vou caminhando a sós, desatinada,
- Ai! pobre cega sem amparo ou guia! -
Sê tu a mão que me conduza ao porto...
Ó doce mãe da luz e do conforto,
Ilumina o terror d’esta agonia!
REZANDO - Auta de Souza
Róseo menino
Feito de luz,
Lírio divino,
Santo Jesus!
Meu cravo olente,
Cor de marfim,
Pobre inocente,
Branco jasmim!
Entre as palhinhas,
Pequeno amor,
Das criancinhas
Tu és a flor.
Cabelo louro,
Olhos azuis...
És meu tesouro,
Manso Jesus!
Estrela pura,
Santo farol,
Flor de candura,
Raio de sol...
Dá-me a esperança
N’um teu olhar:
Loura criança,
Me ensina a amar.
Sonho formoso
Cheio de luz,
Jesus piedoso,
Meu bom Jesus...
Como eu te adoro,
Pequeno assim!
Jesus, eu choro,
Tem dó de mim.
No doce encanto
De um riso teu,
Jesus tão santo,
Leva-me ao Céu!
Em ti espero,
Mostra-me a luz...
Leva-me, eu quero
Ver-te Jesus!
Feito de luz,
Lírio divino,
Santo Jesus!
Meu cravo olente,
Cor de marfim,
Pobre inocente,
Branco jasmim!
Entre as palhinhas,
Pequeno amor,
Das criancinhas
Tu és a flor.
Cabelo louro,
Olhos azuis...
És meu tesouro,
Manso Jesus!
Estrela pura,
Santo farol,
Flor de candura,
Raio de sol...
Dá-me a esperança
N’um teu olhar:
Loura criança,
Me ensina a amar.
Sonho formoso
Cheio de luz,
Jesus piedoso,
Meu bom Jesus...
Como eu te adoro,
Pequeno assim!
Jesus, eu choro,
Tem dó de mim.
No doce encanto
De um riso teu,
Jesus tão santo,
Leva-me ao Céu!
Em ti espero,
Mostra-me a luz...
Leva-me, eu quero
Ver-te Jesus!
REGINA COELI - Auta de Sousa
Teu nome santo, ó Maria,
Tem a doçura inocente
De uma carícia macia,
De uma quimera dolente.
Nele se embala a Esperança
N’uma meiguice dileta,
Como no berço a criança,
Como no verso o poeta.
Do céu teu nome nos desce
Numa harmonia divina,
Como um cicio de prece
Nos lábios de uma menina.
Teu nome é setíneo laço
Prendido em formoso véu,
Qual branca nuvem no espaço,
Qual uma estrela no céu.
Teu nome reflete a imagem
Da melodia serena
Que passa rindo n’aragem
E no voejar da falena.
Uma blandícia suave
Nele cantando divaga,
Como no azul uma ave,
Como no mar uma vaga.
Teu nome, cheiroso lírio,
No níveo cálice encerra
Todo o mistério do Empíreo,
Toda a alegria da Terra.
Como um contraste do encanto,
N’este teu nome diviso
Toda a saudade do pranto
E todo o afago do riso...
Ah! todo o perfume amado,
Toda a fragrância mimosa
Que o colibri namorado
Bebe no seio da rosa;
Toda a pureza do Amor,
Todo o feitiço do olhar,
Orvalho a cair na flor,
Sereno a cair no mar...
Tudo em teu nome palpita,
Tudo embriaga e seduz,
Como a delícia infinita
De um paraíso de luz.
E n’um canto repassado
De lirismo que extasia,
Teu nome vive embalado,
Teu nome santo, ó Maria!
Tem a doçura inocente
De uma carícia macia,
De uma quimera dolente.
Nele se embala a Esperança
N’uma meiguice dileta,
Como no berço a criança,
Como no verso o poeta.
Do céu teu nome nos desce
Numa harmonia divina,
Como um cicio de prece
Nos lábios de uma menina.
Teu nome é setíneo laço
Prendido em formoso véu,
Qual branca nuvem no espaço,
Qual uma estrela no céu.
Teu nome reflete a imagem
Da melodia serena
Que passa rindo n’aragem
E no voejar da falena.
Uma blandícia suave
Nele cantando divaga,
Como no azul uma ave,
Como no mar uma vaga.
Teu nome, cheiroso lírio,
No níveo cálice encerra
Todo o mistério do Empíreo,
Toda a alegria da Terra.
Como um contraste do encanto,
N’este teu nome diviso
Toda a saudade do pranto
E todo o afago do riso...
Ah! todo o perfume amado,
Toda a fragrância mimosa
Que o colibri namorado
Bebe no seio da rosa;
Toda a pureza do Amor,
Todo o feitiço do olhar,
Orvalho a cair na flor,
Sereno a cair no mar...
Tudo em teu nome palpita,
Tudo embriaga e seduz,
Como a delícia infinita
De um paraíso de luz.
E n’um canto repassado
De lirismo que extasia,
Teu nome vive embalado,
Teu nome santo, ó Maria!
SANCTA VIRGO VIRGINUM: PRECE - Auta de Sousa
Ó Santa estremecida,
Formosa e Imaculada!
Estrela abençoada
Do Céu de minha vida!
Rainha casta e Santa
Das virgens do Senhor,
Eterno resplendor
Que o mundo inteiro encanta.
Tu és minha alegria.
Meu único sorriso,
Ó flor do Paraíso,
Angélica Maria!
Ai! quantas vezes, quantas!
A minha fronte inclina
Orando a ti divina,
Ó Santa entre as mais santas!
Ó virgem tão serena!
Tu és meu sonho doce,
Perfume que evolou-se
De um seio de Açucena!
Amada criatura,
Lança-me estremecido
O teu olhar ungido
De imaculada doçura!
Ó Arco da Aliança,
Celeste e branco lírio,
Salva-me do martírio,
Senhora da bonança!
Envolve no teu véu
A minha triste sorte,
E mostra-me na morte
A porta de teu Céu!
Formosa e Imaculada!
Estrela abençoada
Do Céu de minha vida!
Rainha casta e Santa
Das virgens do Senhor,
Eterno resplendor
Que o mundo inteiro encanta.
Tu és minha alegria.
Meu único sorriso,
Ó flor do Paraíso,
Angélica Maria!
Ai! quantas vezes, quantas!
A minha fronte inclina
Orando a ti divina,
Ó Santa entre as mais santas!
Ó virgem tão serena!
Tu és meu sonho doce,
Perfume que evolou-se
De um seio de Açucena!
Amada criatura,
Lança-me estremecido
O teu olhar ungido
De imaculada doçura!
Ó Arco da Aliança,
Celeste e branco lírio,
Salva-me do martírio,
Senhora da bonança!
Envolve no teu véu
A minha triste sorte,
E mostra-me na morte
A porta de teu Céu!
ABENÇOA SENHOR - Auta de Sousa
Abençoa, Senhor esta Casa singela,
Onde a luz do Evangelho esplende, soberana,
E onde encontra guarida a imensa caravana
Dos tristes corações que a prova desmantela.
Neste pouso de paz onde a fé nos irmana,
Em torno do ideal que ao mundo se revela,
A Caridade é sempre atenta sentinela,
Estendendo os seus braços à penúria humana.
Neste recanto amigo, à margem do caminho,
Ninguém procura em vão o conforto e o carinho,
Cansado de bater, chorando, porta em porta...
Porquanto a Tua voz na voz de quem ensina,
A mensagem de amor da Celeste Doutrina,
A renovar no bem a vida nos exorta!...
Onde a luz do Evangelho esplende, soberana,
E onde encontra guarida a imensa caravana
Dos tristes corações que a prova desmantela.
Neste pouso de paz onde a fé nos irmana,
Em torno do ideal que ao mundo se revela,
A Caridade é sempre atenta sentinela,
Estendendo os seus braços à penúria humana.
Neste recanto amigo, à margem do caminho,
Ninguém procura em vão o conforto e o carinho,
Cansado de bater, chorando, porta em porta...
Porquanto a Tua voz na voz de quem ensina,
A mensagem de amor da Celeste Doutrina,
A renovar no bem a vida nos exorta!...
AVE-MARIA - Raimundo Correia
Ave-Maria! Enquanto nas campinas
As boa-noites abrem, misteriosas
Bocas exalam no ar frases divinas
Como suave emanação de rosas...
Ó noivas do infortúnio lacrimosas,
Crianças loiras, mórbidas meninas,
Órfãs de lar e beijos, que piedosas,
Ergueis aos céus as magras mãos franzinas!
Quando rezais, às horas do sol posto,
A Ave-Maria, assim, no azul parece
Sorris-se a Virgem-Mãe dos desvalidos;
Nossa Senhora inclina um pouco o rosto
Para escutar melhor tçao meiga prece,
Hino tão doce e grato aos seus ouvidos.
NA CAPELINHA - Auta de Sousa
Entrou na Igreja sorrindo,
Coberta com um fino véu.
O seu rostinho era lindo
Como o da virgem do Céu.
Foi ajoelhar-se contrita
Ao pé do sagrado altar,
E, com piedade infinita,
Principiou a rezar.
Um doce sorriso veio
Encher-lhe a boca de luz.
Uniu as mãos sobre o seio,
Fitou os olhos na Cruz.
O que dizia... Alguém pode
Adivinhar o que diz
A prece que ao lábio acode
Enquanto a gente é feliz?
Nessa idade, para que
Se reza... (saberei eu?)
A gente reza porque
Também se reza no Céu.
E ela, tão meiga e pura,
Que não conhecia o mal,
E que guardava a ventura
No coração virginal;
Em sua fé de criança
Ingênua e cheia de amor,
Talvez pedisse a esperança
Para os que vivem na dor.
Talvez tivesse gemidos
Para quem vive a chorar,
Para os que vagam perdidos
Nas frias ondas do mar.
E enquanto o lábio querido
Orava piedoso assim,
Do negro olhar comovido
O pranto rolou por fim.
E deslizaram sem calma
As bagas por sua tez,
No desconsolo de um’alma
Que chora a primeira vez.
Su’alma santa onde moram
A Luz, a Inocência e o Bem,
Pedindo pelos que choram
Foi soluçando também.
E compreendendo o segredo
D’aquela doce emoção,
Eu disse baixinho, a medo,
Falando ao meu coração:
Benditos nós que sofremos
Varados por mágoa atroz...
Enquanto assim padecemos
Os anjos pedem por nós.
Coberta com um fino véu.
O seu rostinho era lindo
Como o da virgem do Céu.
Foi ajoelhar-se contrita
Ao pé do sagrado altar,
E, com piedade infinita,
Principiou a rezar.
Um doce sorriso veio
Encher-lhe a boca de luz.
Uniu as mãos sobre o seio,
Fitou os olhos na Cruz.
O que dizia... Alguém pode
Adivinhar o que diz
A prece que ao lábio acode
Enquanto a gente é feliz?
Nessa idade, para que
Se reza... (saberei eu?)
A gente reza porque
Também se reza no Céu.
E ela, tão meiga e pura,
Que não conhecia o mal,
E que guardava a ventura
No coração virginal;
Em sua fé de criança
Ingênua e cheia de amor,
Talvez pedisse a esperança
Para os que vivem na dor.
Talvez tivesse gemidos
Para quem vive a chorar,
Para os que vagam perdidos
Nas frias ondas do mar.
E enquanto o lábio querido
Orava piedoso assim,
Do negro olhar comovido
O pranto rolou por fim.
E deslizaram sem calma
As bagas por sua tez,
No desconsolo de um’alma
Que chora a primeira vez.
Su’alma santa onde moram
A Luz, a Inocência e o Bem,
Pedindo pelos que choram
Foi soluçando também.
E compreendendo o segredo
D’aquela doce emoção,
Eu disse baixinho, a medo,
Falando ao meu coração:
Benditos nós que sofremos
Varados por mágoa atroz...
Enquanto assim padecemos
Os anjos pedem por nós.
UMA IGREJA - Alphonsus de Guimaraens Filho
Que será uma igreja senão como um jardim onde cantam crianças?
Que será uma igreja senão como uma casa onde homens convivem?
Para falar do céu, na perfeita alegria
De uma perene infância?
Que será uma igreja senão como um silêncio iluminado
de luzes frágeis que resistem,
E mais se acendem com as lufadas?
Que será uma igreja senão como uma casa onde homens convivem?
Para falar do céu, na perfeita alegria
De uma perene infância?
Que será uma igreja senão como um silêncio iluminado
de luzes frágeis que resistem,
E mais se acendem com as lufadas?
O DIA E A NOITE - Celina Ferreira
No meio das trevas
a mão do Senhor
ergueu-se ordenando
com grande vigor:
- "Que a luz seja feita!"
E o nada morria.
Da treva desfeita
vem, lúcido, o dia.
E vem precedido
de um leve palor.
Nas tintas mais belas
tirou sua cor.
Das trevas do nada
sobradas do dia
formou Deus a noite
em sombra e poesia.
a mão do Senhor
ergueu-se ordenando
com grande vigor:
- "Que a luz seja feita!"
E o nada morria.
Da treva desfeita
vem, lúcido, o dia.
E vem precedido
de um leve palor.
Nas tintas mais belas
tirou sua cor.
Das trevas do nada
sobradas do dia
formou Deus a noite
em sombra e poesia.
FALAI DE DEUS COM A CLAREZA - Cecília Meireles
Falai de Deus com a clareza
da verdade e da certeza:
com um poder
de corpo e alma que não possa
ninguém, à passagem vossa,
não O entender.
Falai de Deus brandamente,
que o mundo se pôs dolente,
tão sem leis.
Falai de Deus com doçura,
que é difícil ser criatura:
bem o sabeis.
Falai de Deus de tal modo
que por Ele o mundo todo
tenha amor
à vida e à morte, e, de vê-Lo,
O escolha como modelo superior.
Com voz, pensamentos e atos
representai tão exatos
os reinos seus
que todos vão livremente
para esse encontro excelente.
Falai de Deus.
da verdade e da certeza:
com um poder
de corpo e alma que não possa
ninguém, à passagem vossa,
não O entender.
Falai de Deus brandamente,
que o mundo se pôs dolente,
tão sem leis.
Falai de Deus com doçura,
que é difícil ser criatura:
bem o sabeis.
Falai de Deus de tal modo
que por Ele o mundo todo
tenha amor
à vida e à morte, e, de vê-Lo,
O escolha como modelo superior.
Com voz, pensamentos e atos
representai tão exatos
os reinos seus
que todos vão livremente
para esse encontro excelente.
Falai de Deus.
CANTO O IRMÃO ASNO DO PRESÉPIO - Frei Roberto Lopes OFM
Burrico ingênuo, paciente, amigo,
Ofenda alguma levas a mal,
Eu te saúdo porque contigo,
Num miserável e tosco abrigo,
Cantaram anjos pelo Natal.
Bem imagino toda a ternura
De tua longa contemplação
Ao ver deitado na palha dura
O Santo Filho da Virgem Pura,
Nossa Senhora da Conceição.
Ali ficaste quietinho, a um canto,
E com teu bafo davas calor
A quem de frio tremia tanto,
Mas que dos olhos jorrava um pranto
Quente, esquentado num grande amor.
Teus grandes olhos embevecidos,
Nadando em água, cheios de luz,
Em si puderam ter refletidos
- Como dois lagos no areal perdidos –
Os céus, que à terra trouxe Jesus.
Nunca pensaste, nas caminhadas
Que tu fazias pelos trigais,
Passar as horas abençoadas,
Por nós de novo sempre invejadas,
No mais sagrado entre os currais.
Que santo pasmo se terá visto
Entre os pastores (foi ou não foi?)
Quando, num quadro todo imprevisto,
Viram deitado Jesus, O Cristo,
Entre um burrico e um manso boi.
Por que é que a aurora, cheia de orvalho,
Caiu radiante sobre Belém?
E te puseram para o trabalho
Trocando aquele bom agasalho
Pelas frialdades do campo além?
Embora preso nesta labuta,
Ligado à relha, mandado arar,
De ouvido atento, pára, perscruta
Se, bem distante, naquela gruta
O Menininho pôs-se a chorar.
Ó burro ingênuo, criatura mansa,
Da mesma terra do Rei Davi,
Minha alma nunca, jamais se cansa,
Tem sempre o enlevo de uma criança
Se no presépio te vê ali.
Nós te saudamos, paciente amigo,
Nós te invejamos, por bem ou mal,
Asno, que importa? Mas foi contigo,
Num miserável e tosco abrigo,
Que Jesus Cristo teve o Natal!....
Ofenda alguma levas a mal,
Eu te saúdo porque contigo,
Num miserável e tosco abrigo,
Cantaram anjos pelo Natal.
Bem imagino toda a ternura
De tua longa contemplação
Ao ver deitado na palha dura
O Santo Filho da Virgem Pura,
Nossa Senhora da Conceição.
Ali ficaste quietinho, a um canto,
E com teu bafo davas calor
A quem de frio tremia tanto,
Mas que dos olhos jorrava um pranto
Quente, esquentado num grande amor.
Teus grandes olhos embevecidos,
Nadando em água, cheios de luz,
Em si puderam ter refletidos
- Como dois lagos no areal perdidos –
Os céus, que à terra trouxe Jesus.
Nunca pensaste, nas caminhadas
Que tu fazias pelos trigais,
Passar as horas abençoadas,
Por nós de novo sempre invejadas,
No mais sagrado entre os currais.
Que santo pasmo se terá visto
Entre os pastores (foi ou não foi?)
Quando, num quadro todo imprevisto,
Viram deitado Jesus, O Cristo,
Entre um burrico e um manso boi.
Por que é que a aurora, cheia de orvalho,
Caiu radiante sobre Belém?
E te puseram para o trabalho
Trocando aquele bom agasalho
Pelas frialdades do campo além?
Embora preso nesta labuta,
Ligado à relha, mandado arar,
De ouvido atento, pára, perscruta
Se, bem distante, naquela gruta
O Menininho pôs-se a chorar.
Ó burro ingênuo, criatura mansa,
Da mesma terra do Rei Davi,
Minha alma nunca, jamais se cansa,
Tem sempre o enlevo de uma criança
Se no presépio te vê ali.
Nós te saudamos, paciente amigo,
Nós te invejamos, por bem ou mal,
Asno, que importa? Mas foi contigo,
Num miserável e tosco abrigo,
Que Jesus Cristo teve o Natal!....
BRINQUEDOS - Afonso Schmidt
São Nicolau de barbas brancas,
de alto capuz beneditino,
nas costas levava um grande saco
e vai seguindo o seu destino.
É muito tarde. Nas janelas,
há sapatinhos ao sereno:
a cada espera corresponde
o sonho leve de um pequeno.
Súbito, estaca na calçada;
uma janela está vazia
e, pelas frinchas de uma porta,
chegam rumores de alegria.
O Santo pára; está amuado,
acha que o mundo é muito mau
e estas crianças já não querem
esperar por São Nicolau.
Mas, logo fica curioso,
quer descobrir porque naquela
casa não há um sapatinho
no canto escuro da janela.
Vai espiar pelo buraco
da fechadura… – Pobrezinhos,
são os meninos do trapeiro,
nunca tiveram sapatinhos…
E vê, que à falta de bonecas,
eles divertem o casal,
enquanto o avô fuma num canto,
São Nicolau, mas de avental…
Todos estão muito contentes
o Santo ri de olhos molhados
e vai seguindo à luz branquinha
do plenilúnio nos telhados.
Pisa de leve sobre as folhas,
diz a sorrir palavras mansas:
“Essas crianças são os brinquedos
e esses papais são as crianças…”
de alto capuz beneditino,
nas costas levava um grande saco
e vai seguindo o seu destino.
É muito tarde. Nas janelas,
há sapatinhos ao sereno:
a cada espera corresponde
o sonho leve de um pequeno.
Súbito, estaca na calçada;
uma janela está vazia
e, pelas frinchas de uma porta,
chegam rumores de alegria.
O Santo pára; está amuado,
acha que o mundo é muito mau
e estas crianças já não querem
esperar por São Nicolau.
Mas, logo fica curioso,
quer descobrir porque naquela
casa não há um sapatinho
no canto escuro da janela.
Vai espiar pelo buraco
da fechadura… – Pobrezinhos,
são os meninos do trapeiro,
nunca tiveram sapatinhos…
E vê, que à falta de bonecas,
eles divertem o casal,
enquanto o avô fuma num canto,
São Nicolau, mas de avental…
Todos estão muito contentes
o Santo ri de olhos molhados
e vai seguindo à luz branquinha
do plenilúnio nos telhados.
Pisa de leve sobre as folhas,
diz a sorrir palavras mansas:
“Essas crianças são os brinquedos
e esses papais são as crianças…”
A SANTA INÊS - José de Anchieta
Na vinda de sua imagem
Cordeirinha linda,
Como folga o povo,
Porque vossa vinda
Lhe dá lume novo.
Cordeirinha santa,
De Jesus querida,
ossa santa vida
O Diabo espanta.
Por isso vos canta
Com prazer o povo,
Porque vossa vinda
Lhe dá lume novo.
Nossa culpa escura
Fugirá depressa,
Pois vossa cabeça
Vem com luz tão pura.
Vossa formosura
Honra é do povo,
Porque vossa vinda
Lhe dá lume novo.
Virginal cabeça,
Pela fé cortada,
Com vossa chegada
Já ninguém pereça;
Vinde mui depressa
Ajudar o povo,
Pois com vossa vinda
Lhe dais lume novo.
Vós sois cordeirinha
De Jesus Fermoso;
Mas o vosso Esposo
já vos fez Rainha.
Também padeirinha
Sois do vosso Povo,
pois com vossa vinda,
Lhe dais trigo novo.
Não é de Alentejo
Este vosso trigo,
Mas Jesus amigo
É vosso desejo.
Morro, porque vejo
Que este nosso povo
Não anda faminto
Deste trigo novo.
Santa Padeirinha,
Morta com cutelo,
Sem nenhum farejo
É vossa farinha
Ela é mezinha
Com que sara o povo
Que com vossa vinda
Terá trigo novo.
O pão, que amassasses
Destro em vosso peito,
É o amor perfeito
Com que Deus amastes.
Deste vos fartasses,
Deste dais ao povo,
Por que deixe o velho
Pelo trigo novo.
Não se vende em praça,
Este pão da vida,
Porque é comida
Que se dá de graça.
Oh preciosa massa!
Oh que pão tão novo
Que com vossa vinda
Quer Deus dar ao povo!
Oh que doce bolo
Que se chama graça!
Quem sem ela passa
É mui grande tolo,
Homem sem miolo
Qualquer deste povo
Que não é faminto
Deste pão tão novo.
Cordeirinha linda,
Como folga o povo,
Porque vossa vinda
Lhe dá lume novo.
Cordeirinha santa,
De Jesus querida,
ossa santa vida
O Diabo espanta.
Por isso vos canta
Com prazer o povo,
Porque vossa vinda
Lhe dá lume novo.
Nossa culpa escura
Fugirá depressa,
Pois vossa cabeça
Vem com luz tão pura.
Vossa formosura
Honra é do povo,
Porque vossa vinda
Lhe dá lume novo.
Virginal cabeça,
Pela fé cortada,
Com vossa chegada
Já ninguém pereça;
Vinde mui depressa
Ajudar o povo,
Pois com vossa vinda
Lhe dais lume novo.
Vós sois cordeirinha
De Jesus Fermoso;
Mas o vosso Esposo
já vos fez Rainha.
Também padeirinha
Sois do vosso Povo,
pois com vossa vinda,
Lhe dais trigo novo.
Não é de Alentejo
Este vosso trigo,
Mas Jesus amigo
É vosso desejo.
Morro, porque vejo
Que este nosso povo
Não anda faminto
Deste trigo novo.
Santa Padeirinha,
Morta com cutelo,
Sem nenhum farejo
É vossa farinha
Ela é mezinha
Com que sara o povo
Que com vossa vinda
Terá trigo novo.
O pão, que amassasses
Destro em vosso peito,
É o amor perfeito
Com que Deus amastes.
Deste vos fartasses,
Deste dais ao povo,
Por que deixe o velho
Pelo trigo novo.
Não se vende em praça,
Este pão da vida,
Porque é comida
Que se dá de graça.
Oh preciosa massa!
Oh que pão tão novo
Que com vossa vinda
Quer Deus dar ao povo!
Oh que doce bolo
Que se chama graça!
Quem sem ela passa
É mui grande tolo,
Homem sem miolo
Qualquer deste povo
Que não é faminto
Deste pão tão novo.
O FILHO DE PATMORE - Atílio Milano
Meu filho, ralhei contigo,
eu, que sou tão teu amigo!
Mas, se sou tão teu amigo,
por que é que ralhei contigo?!
Quando me desobedeces
já com o homem te pareces...
Vais ser o homem que pareces:
vejo que não me obedeces!
Foste chorar para a cama,
ofendido com quem te ama!
E teu pai, que tanto te ama,
salta tão triste da cama
e vai dar-te a sua bênção.
Ah, vocês filhos não pensam,
ah, vocês filhos nem pensam
que um pai é um deus, dando a bênção!
Se tua mãe - pobre morta! -
surgisse naquela porta...
Nisto: é ela! parou na porta.
(Uma mãe nunca está morta!)
"Não zangues como nosso filho!"
disse zangada, com um brilho
no olhar, com esse mesmo brilho
que há nos teus olhos, meu filho!
Deisto-me humilde, rezando:
Meu Deus! perdoa-me quando
eu for impaciente, quando...
E o pai, criança como o filho,
pegou no sono, chorando!
ACALANTO DE JOHN TALBOT - Manuel Bandeira
Dorme, meu filhinho,
Dorme sossegado.
Dorme, que a teu lado
Cantarei baixinho.
O dia não tarda...
Vai amanhecer:
Como é frio o ar!
O anjinho da guarda
Que o Senhor te deu,
Pode adormecer,
Pode descansar,
Que te guardo eu.
Dorme sossegado.
Dorme, que a teu lado
Cantarei baixinho.
O dia não tarda...
Vai amanhecer:
Como é frio o ar!
O anjinho da guarda
Que o Senhor te deu,
Pode adormecer,
Pode descansar,
Que te guardo eu.
DEUS - Casimiro de Abreu
Eu me lembro! eu me lembro! Era pequeno
E brincava na praia; o mar bramia
E erguendo o dorso altivo, sacudia
A branca escuma para o céu sereno.
E eu disse a minha mãe neste momento:
"Que dura orquesta! Que furor insano!
Que pode haver maior que o oceano
Ou que seja mais forte que o vento?!"
Minha mãe a sorrir olhou p'r'os céus
E respondeu: "Um Ser que nós não vemos
É maior do que o mar que nós tememos,
Mais forte que o tufão! Meu filho, é - Deus!"
E brincava na praia; o mar bramia
E erguendo o dorso altivo, sacudia
A branca escuma para o céu sereno.
E eu disse a minha mãe neste momento:
"Que dura orquesta! Que furor insano!
Que pode haver maior que o oceano
Ou que seja mais forte que o vento?!"
Minha mãe a sorrir olhou p'r'os céus
E respondeu: "Um Ser que nós não vemos
É maior do que o mar que nós tememos,
Mais forte que o tufão! Meu filho, é - Deus!"
DEUS CRIADOR - Monsenhor Primo Vieira
Quem fez os céus, as estrelas,
quem tremem no azul sem véu,
e são archotes da noite
dependurados no céu?
Quem fez o sol para o dia
e no seu giro o conduz?
Quem deu à lua de prata
sua coroa de luz?
Quem fez a terra gigante,
montanhas, vales sem fim?
E as flores, que, em primavera
fazem da terra um jardim?
Quem fez, ó boa criança,
o mundo dos minerais,
e deu vida aos passarinhos,
às plantas e aos animais?
Quem fez os rios, as fontes.
os elementos do ar,
e as maravilhas sem conta
que há nos mistérios do mar?
Quem fez o homem que pensa,
e tem uma alma imortal,
que sobre os seres domina,
e conhece o bem e o mal?
- Foi Deus por um ato simples
de vontade, como crês:
pois disse: faça-se o mundo!
Do nada o mundo se fez!
E acima deste universo
dos espaços muito além,
fez uma coroa de anjos
para louvá-lo também!
Se tudo tirou do nada,
por uma razão de amor,
ah! dize-lhe de mãos postas,
bendito sejais, Senhor!
quem tremem no azul sem véu,
e são archotes da noite
dependurados no céu?
Quem fez o sol para o dia
e no seu giro o conduz?
Quem deu à lua de prata
sua coroa de luz?
Quem fez a terra gigante,
montanhas, vales sem fim?
E as flores, que, em primavera
fazem da terra um jardim?
Quem fez, ó boa criança,
o mundo dos minerais,
e deu vida aos passarinhos,
às plantas e aos animais?
Quem fez os rios, as fontes.
os elementos do ar,
e as maravilhas sem conta
que há nos mistérios do mar?
Quem fez o homem que pensa,
e tem uma alma imortal,
que sobre os seres domina,
e conhece o bem e o mal?
- Foi Deus por um ato simples
de vontade, como crês:
pois disse: faça-se o mundo!
Do nada o mundo se fez!
E acima deste universo
dos espaços muito além,
fez uma coroa de anjos
para louvá-lo também!
Se tudo tirou do nada,
por uma razão de amor,
ah! dize-lhe de mãos postas,
bendito sejais, Senhor!
AVE-MARIA - Vicente de Carvalho
Sobre a soleira da porta
Da casa pegada à minha
Vejo sentada a vizinha:
Moça, e bonita... Que importa?
Tem nos braços o filhinho;
Fala-lhe, toda carinho;
Ele ouve; sorri; depois,
Responde-lhe, balbucia...
E, de mãos postas, os dois
Murmuram a Ave-Maria.
Ante meus olhos perpassa
Uma visão: imagino
Maria, cheia de graça,
Jesus, louro e pequenino.
Uma tarde cor-de-rosa...
Uma vila assim modesta,
Assim tristonha como esta...
De pescadores, também...
Sobre a planície arenosa
Por onde o Jordão deriva
Pousa a sombra evocativa,
Das montanhas de Sichém...
À porta de humilde choça,
Um mulher... Quem é ela?
É pobre... é jovem... é bela...
E e Mãe: comovida, a espaços
O seu olhar se adoça,
O seu olhar se ilumina
Para a figura divina
Do filho que tem nos braços.
Mostra-lhe, à noite que estrela
O céu e que a terra ensombra,
Como a tera é toda sombra
Como o céu é todo luz...
E o filho, enlevado nela,
Em êxtase balbucia...
A primeira Ave-Maria
Quem a rezou foi Jesus.
AVE! MARIA - Cruz e Sousa
Ave! Maria das Estrelas, Ave!
Cheia de graça do luar, Maria!
Harmonia de cântico suave,
das harpas celestiais branda harmonia…
Nuvem d’incensos através da nave
quando o tempo de pompas irradia
e em prantos o órgão vai plangendo grave
a profunda e gemente litania…
Seja bendito o fruto do teu ventre,
Jesus, mais belo dentre os astros e entre
as mulheres judaicas mais amado…
Ó Luz! Eucaristia da beleza,
chama sagrada no Evangelho acesa,
maravilha do Amor e do Pecado!
Cheia de graça do luar, Maria!
Harmonia de cântico suave,
das harpas celestiais branda harmonia…
Nuvem d’incensos através da nave
quando o tempo de pompas irradia
e em prantos o órgão vai plangendo grave
a profunda e gemente litania…
Seja bendito o fruto do teu ventre,
Jesus, mais belo dentre os astros e entre
as mulheres judaicas mais amado…
Ó Luz! Eucaristia da beleza,
chama sagrada no Evangelho acesa,
maravilha do Amor e do Pecado!
SÃO FRANCISCO - Vinicius de Moraes
Lá vai São Francisco
Pelo caminho
De pé descalço
Tão pobrezinho
Dormindo à noite
Junto ao moinho
Bebendo a água
Do ribeirinho
Lá vai São Francisco
De pé no chão
Levando nada
No seu surrão
Dizendo ao vento
Bom dia, amigo
Dizendo ao fogo
Saúde, irmão
Lá vai São Francisco
Pelo caminho
Levando ao colo
Jesuscristinho
Fazendo festa
No menininho
Contando histórias
Pros passarinhos.
Pelo caminho
De pé descalço
Tão pobrezinho
Dormindo à noite
Junto ao moinho
Bebendo a água
Do ribeirinho
Lá vai São Francisco
De pé no chão
Levando nada
No seu surrão
Dizendo ao vento
Bom dia, amigo
Dizendo ao fogo
Saúde, irmão
Lá vai São Francisco
Pelo caminho
Levando ao colo
Jesuscristinho
Fazendo festa
No menininho
Contando histórias
Pros passarinhos.
AVE-MARIA! - Fagundes Varela
A noite desce - lentas e tristes
Cobrem as sombras a serrania,
Calam-se as aves, choram os ventos,
Dizem os gênios: - Ave-Maria!
Na torre estreita de pobre templo
Ressoa o sino da freguesia,
Abrem-se as flores, Vesper desponta,
Cantam os anjos: - Ave-Maria!
No tosco alvergue de seus maiores,
Onde só reinam paz e alegria,
Entre os filhinhos o bom colono
Repete as vozes: - Ave-Maria!
E, longe, longe, na velha estrada,
Pára e saudades à pátria envia
Romeiro exausto que o céu contempla,
E fala aos ermos: - Ave-Maria!
Incerto nauta por feios mares,
Onde se estende névoa sombria,
Se encosta ao mastro, descobre a fronte,
Reza baixinho: - Ave-Maria!
Nas soledades, sem pão nem água,
Sem pouso e tenda, sem luz nem guia,
Triste mendigo, que as praças busca,
Curva-se e clama: - Ave-Maria!
Só nas alcovas, nas salas dúbias,
Nas longas mesas de longa orgia
Não diz o ímpio, não diz o avaro,
Não diz o ingrato: - Ave-Maria!
Ave-Maria! - No céu, na terra!
Luz da aliança! Doce harmonia!
Hora divina! Sublime estância!
Bendita sejas! - Ave-Maria!
Cobrem as sombras a serrania,
Calam-se as aves, choram os ventos,
Dizem os gênios: - Ave-Maria!
Na torre estreita de pobre templo
Ressoa o sino da freguesia,
Abrem-se as flores, Vesper desponta,
Cantam os anjos: - Ave-Maria!
No tosco alvergue de seus maiores,
Onde só reinam paz e alegria,
Entre os filhinhos o bom colono
Repete as vozes: - Ave-Maria!
E, longe, longe, na velha estrada,
Pára e saudades à pátria envia
Romeiro exausto que o céu contempla,
E fala aos ermos: - Ave-Maria!
Incerto nauta por feios mares,
Onde se estende névoa sombria,
Se encosta ao mastro, descobre a fronte,
Reza baixinho: - Ave-Maria!
Nas soledades, sem pão nem água,
Sem pouso e tenda, sem luz nem guia,
Triste mendigo, que as praças busca,
Curva-se e clama: - Ave-Maria!
Só nas alcovas, nas salas dúbias,
Nas longas mesas de longa orgia
Não diz o ímpio, não diz o avaro,
Não diz o ingrato: - Ave-Maria!
Ave-Maria! - No céu, na terra!
Luz da aliança! Doce harmonia!
Hora divina! Sublime estância!
Bendita sejas! - Ave-Maria!
HISTÓRIA CRISTÃ - Murilo Araújo
Natal.
Missa do galo assistida de estrelas.
E à meia-noite havia tanta glória
na grande catedral,
que o Menino Jesus que não ama a riqueza
no retábulo de ouro onde estava, no altar
moveu os bracinhos, sério,
e começou no berço a gritar e a chorar!
Logo, para acalmá-lo,
o sacerdote em vão o embalou nos joelhos
e mostrou-lhe no alto as lâmpadas da festa
a tremer e a brilhar…
Acenderam-se em vão mais cristais com espelhos.
O Menino Jesus continuou a chorar.
Embalde o órgão gemeu cantilenas serenas
de adormecer, de acalentar;
Em vão mais docemente entoaram os hossanas.
Mais incenso! Mais rosas!
E o Menino Jesus a chorar, a chorar…
Cem senhoras do escol,
com perfumes e jóias e sorrisos em flor,
o tomaram nas mãos.
Cem mantos de veludo em vão o aconchegaram
em cem colos cristãos.
E o arcebispo até de dalmática real
agitou de mansinho aos olhos do Menino
dez campainhas – dez! – todas em matinada
a tocar:
tilim-tim! Tilim-tim…
Nada, nada;
Jesus… continuou a chorar.
Então uma preta humilde, uma preta descalça,
de pixaim branquinho, a tomá-lo se ergueu;
afagou-o a tremer com ingénua doçura,
maternalmente o repreendeu:
“Vem drumi, vem drumi, Sinhô moço!”
E, oh milagre!
O Menino Jesus sorriu e adormeceu.
Missa do galo assistida de estrelas.
E à meia-noite havia tanta glória
na grande catedral,
que o Menino Jesus que não ama a riqueza
no retábulo de ouro onde estava, no altar
moveu os bracinhos, sério,
e começou no berço a gritar e a chorar!
Logo, para acalmá-lo,
o sacerdote em vão o embalou nos joelhos
e mostrou-lhe no alto as lâmpadas da festa
a tremer e a brilhar…
Acenderam-se em vão mais cristais com espelhos.
O Menino Jesus continuou a chorar.
Embalde o órgão gemeu cantilenas serenas
de adormecer, de acalentar;
Em vão mais docemente entoaram os hossanas.
Mais incenso! Mais rosas!
E o Menino Jesus a chorar, a chorar…
Cem senhoras do escol,
com perfumes e jóias e sorrisos em flor,
o tomaram nas mãos.
Cem mantos de veludo em vão o aconchegaram
em cem colos cristãos.
E o arcebispo até de dalmática real
agitou de mansinho aos olhos do Menino
dez campainhas – dez! – todas em matinada
a tocar:
tilim-tim! Tilim-tim…
Nada, nada;
Jesus… continuou a chorar.
Então uma preta humilde, uma preta descalça,
de pixaim branquinho, a tomá-lo se ergueu;
afagou-o a tremer com ingénua doçura,
maternalmente o repreendeu:
“Vem drumi, vem drumi, Sinhô moço!”
E, oh milagre!
O Menino Jesus sorriu e adormeceu.
DO DÉCIMO SEGUNDO POEMA DA VIDA - Jamil Almansur Haddad
E tu dirias:
ao que eu dissesse: Eu tenho frio - : Eu sou um manto!
- e ao que dissesse: Eu tenho fome - : Eu sou um pão!
Tivesse cada alma
a generosidade das nascentes
que, nos caminhos ásperos,
matam as sedes
de todos os passantes.
Tivesse cada alma
um destino lúcudo de árvore,
e fosse sombra para acolher
e fosse fruto para nutrir.
Tivesse cada alma o destino
do que, dentro da noite, vai levando a lanterna
para que o caminhante não se transvie.
Cada homem revivesse
o gesto de grande luz
do Cirineu,
o que ajudou a Cristo a levar sua cruz!
ao que eu dissesse: Eu tenho frio - : Eu sou um manto!
- e ao que dissesse: Eu tenho fome - : Eu sou um pão!
Tivesse cada alma
a generosidade das nascentes
que, nos caminhos ásperos,
matam as sedes
de todos os passantes.
Tivesse cada alma
um destino lúcudo de árvore,
e fosse sombra para acolher
e fosse fruto para nutrir.
Tivesse cada alma o destino
do que, dentro da noite, vai levando a lanterna
para que o caminhante não se transvie.
Cada homem revivesse
o gesto de grande luz
do Cirineu,
o que ajudou a Cristo a levar sua cruz!
AUTO DE NATAL - Oliveira Ribeiro Neto
Maria lavava,
José estendia,
e o Menino chorava
do frio que fazia.
Bom dia, Nossa Senhora.
Eu era negra fugida,
e foi a comadre minha
quem me disse que a senhora
havia tido um Menino.
Eu sei cuidar de crianças
vim cuidar do vosso filho.
Não chores, Menino,
Dorme, meu amor,
que as facas que cortam
dão talhos sem dor.
- Sei fazer todo serviço,
passar roupa, cozinhar,
Levanto de madrugada
e saio com tabuleiro
de vender cocada-puxa
que eu mesma faço de noite,
e posso vos ajudar.
Molho as plantas da varanda,
faço o mingau do Menino.
Vosso esposo São José
não me podia comprar?
E em vez de negra fugida
eu seria a vossa negra,
nessa vida e na outra vida,
para adorar o Menino
e fazer vosso café,
e varrer bem varridinhos
os cavacos da oficina
do meu amo e vosso esposo
o meu senhor São José.
José estendia,
e o Menino chorava
do frio que fazia.
Bom dia, Nossa Senhora.
Eu era negra fugida,
e foi a comadre minha
quem me disse que a senhora
havia tido um Menino.
Eu sei cuidar de crianças
vim cuidar do vosso filho.
Não chores, Menino,
Dorme, meu amor,
que as facas que cortam
dão talhos sem dor.
- Sei fazer todo serviço,
passar roupa, cozinhar,
Levanto de madrugada
e saio com tabuleiro
de vender cocada-puxa
que eu mesma faço de noite,
e posso vos ajudar.
Molho as plantas da varanda,
faço o mingau do Menino.
Vosso esposo São José
não me podia comprar?
E em vez de negra fugida
eu seria a vossa negra,
nessa vida e na outra vida,
para adorar o Menino
e fazer vosso café,
e varrer bem varridinhos
os cavacos da oficina
do meu amo e vosso esposo
o meu senhor São José.
ATO DE CARIDADE - Djalma Andrade
Que eu faça o bem e de tal modo o faça,
Que ninguém saiba o quanto me custou.
- Mãe, espero em ti mais esta graça:
- Que eu seja bom sem parecer que o sou.
Que o pouco que me dês me satisfaça,
E se, do pouco mesmo, algum sobrou,
Que eu leve esta migalha onde a desgraça
Inesperadamente penetrou.
Que a minha mesa, a mais, tenha um talher,
Que será, minha mãe, Senhora nossa,
Para o pobre faminto que vier.
Que eu transponha tropeços e embaraços:
Que eu não coma, sozinho, o pão que possa
Ser partido, por mim, em dois pedaços.
Que ninguém saiba o quanto me custou.
- Mãe, espero em ti mais esta graça:
- Que eu seja bom sem parecer que o sou.
Que o pouco que me dês me satisfaça,
E se, do pouco mesmo, algum sobrou,
Que eu leve esta migalha onde a desgraça
Inesperadamente penetrou.
Que a minha mesa, a mais, tenha um talher,
Que será, minha mãe, Senhora nossa,
Para o pobre faminto que vier.
Que eu transponha tropeços e embaraços:
Que eu não coma, sozinho, o pão que possa
Ser partido, por mim, em dois pedaços.
ORAÇÃO DA MANHÃ - Emiliano Pernetta
Amanheceu. A luz de um claro e puro brilho
Tem a frescura ideal de uma roseira em flor :
Antes de tudo o mais, ajoelha-te, meu filho,
Ajoelha-te e bendize a obra do Criador.
Ajoelha-te aqui, e sorvendo esse aroma
De feno, e rosa, e musgo, e bálsamo sutil,
Que vem do seio azul dessa manhã, que assoma,
Na radiosa nitidez de uma manhã de Abril,
Bendize a força, a graça, a seiva, a juventude,
A hercúlea robustez daqueles pinheirais,
Que resistem, de pé, dentro da casca rude,
Aos mugidos do vento e aos rijos temporais.
Ama essa terra como um fauno que por entre
A silva agreste vive; ama tudo o que vês;
Todos somos irmãos, filhos do mesmo ventre,
Filhos do mesmo amor e da mesma embriaguez.
Abraça os troncos nus, beija esses ramos de ouro,
Ajoelha-te aos pés dos que te querem bem :
Que riqueza, Senhor, que límpido tesouro!
Que grande coração que o arvoredo tem!
Pede a Deus que conhece os bons e maus caminhos
Que conhece o passado e conhece o porvir,
Que te aponte de longe os cardos e os espinhos,
E que te estenda a mão, quando fores cair...
Que te faça correr, oh" pobre criatura,
A vida, sonho vão, coisa leve e fugaz,
Como um rio, através de uma floresta escura,
Corre límpido, nu, silencioso, em paz.
Que te importa o clamor da glória, que se perde
Como um fumo no ar, se, apagado entre os teus,
Mais obscuro, talvez, que aquele ramo verde,
Podes viver feliz, com a graça de Deus!
Tem a frescura ideal de uma roseira em flor :
Antes de tudo o mais, ajoelha-te, meu filho,
Ajoelha-te e bendize a obra do Criador.
Ajoelha-te aqui, e sorvendo esse aroma
De feno, e rosa, e musgo, e bálsamo sutil,
Que vem do seio azul dessa manhã, que assoma,
Na radiosa nitidez de uma manhã de Abril,
Bendize a força, a graça, a seiva, a juventude,
A hercúlea robustez daqueles pinheirais,
Que resistem, de pé, dentro da casca rude,
Aos mugidos do vento e aos rijos temporais.
Ama essa terra como um fauno que por entre
A silva agreste vive; ama tudo o que vês;
Todos somos irmãos, filhos do mesmo ventre,
Filhos do mesmo amor e da mesma embriaguez.
Abraça os troncos nus, beija esses ramos de ouro,
Ajoelha-te aos pés dos que te querem bem :
Que riqueza, Senhor, que límpido tesouro!
Que grande coração que o arvoredo tem!
Pede a Deus que conhece os bons e maus caminhos
Que conhece o passado e conhece o porvir,
Que te aponte de longe os cardos e os espinhos,
E que te estenda a mão, quando fores cair...
Que te faça correr, oh" pobre criatura,
A vida, sonho vão, coisa leve e fugaz,
Como um rio, através de uma floresta escura,
Corre límpido, nu, silencioso, em paz.
Que te importa o clamor da glória, que se perde
Como um fumo no ar, se, apagado entre os teus,
Mais obscuro, talvez, que aquele ramo verde,
Podes viver feliz, com a graça de Deus!
O PRESÉPIO - Joaquim Serra
Na palhoça iluminada,
Que fica junto da ermida,
Des que a missa foi cantada
Se congrega a multidão;
Toldo de mirta florida,
Flores de mágico aroma
Ornam o presépio, que toma
Na sala grande extensão.
Quão lindo está! Não lhe falta
Nem o astro milagroso
Que de repente brilhou;
Nem o galo, que o repouso
Deixara por noite alta
E que inspirado cantou!
Tudo o que a lenda memora
E consagra a tradição,
Vê-se ali, grosseiro embora,
Despido de perfeição.
Céu de estrelinhas douradas,
Estrelas de papelão;
Brancas nuvens fabricadas
Da plumagem do algodão!
Anjos soltos pelos ares,
Peixes saindo dos mares,
Feras chegando do além.
Marcha tudo, e vêm na frente
Os Reis Magos do Oriente
Em demanda de Belém.
É esta a lapa; o Menino
Nas palhas está deitado,
Com um sorriso de alegria
Todo doçura e amor!
Contempla o quadro divino
São José ajoelhado,
E a Santíssima Maria
De Jericó meiga flor!
Trajando risonhas cores
Com muitos laços de fitas,
Rapazes, moças bonitas
Formam grupos de pastores.
Que curiosos bailados,
Com maracás e pandeiros!
E o ruído dos cajados
Desses risonhos romeiros!
Essa quadrilha dançante,
Cantando versos festivos,
Aos pés do celeste infante
Vai depor seus donativos:
Frutas, doces, sazonadas,
Ramilhetes de açucenas,
Cera, peles delicadas,
Pombinhos de brancas penas.
São as joias que os pastores
Dão ao Deus onipotente!
E o povo aplaude os cantores
E o espetáculo inocente.
Eis o presepe singelo
Da devoção popular;
Oratório alegre e belo
Sagrado, risonho altar!
Que fica junto da ermida,
Des que a missa foi cantada
Se congrega a multidão;
Toldo de mirta florida,
Flores de mágico aroma
Ornam o presépio, que toma
Na sala grande extensão.
Quão lindo está! Não lhe falta
Nem o astro milagroso
Que de repente brilhou;
Nem o galo, que o repouso
Deixara por noite alta
E que inspirado cantou!
Tudo o que a lenda memora
E consagra a tradição,
Vê-se ali, grosseiro embora,
Despido de perfeição.
Céu de estrelinhas douradas,
Estrelas de papelão;
Brancas nuvens fabricadas
Da plumagem do algodão!
Anjos soltos pelos ares,
Peixes saindo dos mares,
Feras chegando do além.
Marcha tudo, e vêm na frente
Os Reis Magos do Oriente
Em demanda de Belém.
É esta a lapa; o Menino
Nas palhas está deitado,
Com um sorriso de alegria
Todo doçura e amor!
Contempla o quadro divino
São José ajoelhado,
E a Santíssima Maria
De Jericó meiga flor!
Trajando risonhas cores
Com muitos laços de fitas,
Rapazes, moças bonitas
Formam grupos de pastores.
Que curiosos bailados,
Com maracás e pandeiros!
E o ruído dos cajados
Desses risonhos romeiros!
Essa quadrilha dançante,
Cantando versos festivos,
Aos pés do celeste infante
Vai depor seus donativos:
Frutas, doces, sazonadas,
Ramilhetes de açucenas,
Cera, peles delicadas,
Pombinhos de brancas penas.
São as joias que os pastores
Dão ao Deus onipotente!
E o povo aplaude os cantores
E o espetáculo inocente.
Eis o presepe singelo
Da devoção popular;
Oratório alegre e belo
Sagrado, risonho altar!
IRENE NO CÉU - Manuel Bandeira
Irene preta
Irene boa
Irene sempre de bom humor.
Imagino Irene entrando no céu:
- Licença, meu branco!
E São Pedro, bonachão:
- Entra, Irene. Você não precisa pedir licença.
À SUA SANTIDADE PAULO VI - Manuel Bandeira
Quando em torno de nós raiva o funesto
Desvario, e na infernal perplexidade
Erramos o caminho da verdade
Nos Santos Evangelhos manifesto,
Baixem as luzes do divino Texto
Pela boca de Vossa Santidade
Para reconduzir a cristandade
Ao aprisco do Pai, ó Paulo VI!
Nest'hora em que de cada continente
Vêm mil gemidos e incessantemente
Em sangue humano o duro chão se empapa,
Falai, falai, que ouvir a vossa isenta
Palavra é ouvir em meio da tormenta
A voz de Deus na voz de um grande Papa.
ORAÇÃO PARA AVIADORES - Manuel Bandeira
Santa Clara, clareai
Estes ares.
Dai-nos ventos regulares,
De feição.
Este mares, estes ares
Clareai.
Santa Clara, dai-nos sol.
Se baixar a cerração,
Alumiai
Meus olhos na cerração.
Estes montes e horizontes
Clareai.
Santa Clara, no mau tempo
Sustentai
Nossas asas.
A salvo de árvores, casas
E penedos, nossas asas
Governai.
Santa Clara, clareai.
Afastai
Todo risco.
Por amor de S. Francisco,
Vosso mestre, nosso pai,
Santa Clara, todo risco
Dissipai.
Santa Clara, clareai.
O MENINO DOENTE - Manuel Bandeira
O menino dorme.
Para que o menino
Durma sossegaddo,
Sentado a seu lado
A mãezinha canta:
- "Dodói, vai-te embora!
"Deixa o meu filhinho.
"Dorme... dorme... meu..."
Morta de fadiga,
Ela adormeceu.
Então, no ombro dela,
Um vulto de santa,
Na mesma cantiga,
Na mesma voz dela,
Se debruça e canta:
-"Dorme, meu amor.
"Domre, meu benzinho..."
E o menino dorme.
segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011
A ANUNCIAÇÃO - Manuel Bandeira
Seis meses passados sobre
A angélica anunciação
Do nascimento de João, Santo filho de Isabel,
Baixou o arcanjo Gabriel
À Galiléia e na casa
Do carpinteiro José
Entrou e diante da virgem
Desposada com o varão
- Maria ela se chamava -
Curvou-se em genuflexão.
Dizendo com voz suave
Mais que a aura da manhã: "Ave,
Maria cheia de graça!
Nosso Senhor é contigo,
Tu bendita entre as mulheres".
E ela, vendo-o assim, turbou-se
Muito de suas palavras.
Mas o anjo, tranquilizando-a,
Falou: "Maria, não temas:
Deus escolheu-te, a mais pura
Entre todas as mulheres,
Para um filho conceberes
No teu ventre e, dado à luz,
O chamarás de Jesus;
O santo Deus fá-lo-á grande,
Dar-lhe-á o trono de Davi,
Seu reino não terá fim".
E disse Maria ao anjo:
"Como pode ser assim,
Se não conheço varão?"
E, respondendo o anjo, disse-lhe:
"Descerá sobre ti o Espírito
Santo e a virtude do Altíssimo
Te cobrirá com sua sombra;
Pelo que também o Santo
Que de ti há de nascer,
Filho de Deus terá nome,
Com ser filho de mulher,
Pois tua prima Isabel
Não concebeu na velhice,
Sendo estéril? A Deus nada
É impossível". O anjo disse
E afastou-se de Maria.
Como no extremo horizonte
A primeira, desmaiada
Celagem da madrugada,
Duas rosas transluziram
Nas faces da Virgem pura:
Já era Jesus no seu sangue,
Antes de, infinito Espírito
Mudado em corpo finito,
Se fixar em forma humana
na matriz santificada.
O CRUCIFIXO - Manuel Bandeira
É um crucifixo de marfim
Ligeiramente amarelado,
Pátina do tempo escoado.
Sempre o vi patinado assim.
Mãe, irmã, pai meus estreitado
Tiveram-no ao chegar o fim.
Hoje, em meu quarto colocado,
Ei-lo velando sobre mim.
E quando se cumprir aquele
Instante, que tardando vai,
De eu deixar esta vida, quero
Morrer agarrado com ele.
Talvez me salve. Como - espero -
Minha mãe, minha irmã, meu pai.
CANTO DE NATAL - Manuel Bandeira
O nosso menino
Nasceu em Belém.
Nasceu tão-somente
Para querer bem.
Nasceu sobre as palhas
O nosso menino.
Mas a mãe sabia
Que ele era divino.
Vem para sofrer
A morte na cruz,
O nosso menino.
Seu nome é Jesus.
Por nós ele aceita
O humano destino:
Louvemos a glória
De Jesus menino.
PROGRAMA PARA DEPOIS DE MINHA MORTE - Manuel Bandeira
... esta outra vida de aquém-túmulo.
Guimarães Rosa
Depois de morto, quando eu chegar ao outro mundo,
Primeiro quererei beijar meus pais, meus irmãos, meus avós, meus tios, meus primos.
Depois irei abraçar longamente uns amigos - Vasconcelos. Ovalle, Mário...
Gostaria ainda de me avistar com o santo Francisco de Assis.
Mas quem sou eu? Não mereço.
Isto feito, me abismarei na contemplação de Deus e de sua glória
Esquecido para sempre de todas as delícias, dores, perplexidades
Desta outra vida de aquém-túmulo.
UBIQUIDADE - Manuel Bandeira
Estás em tudo que penso,
Estás em quanto imagino:
Estás no horizonte imenso,
Estás no grão pequenino.
Estás na ovelha que pasce,
Estás no rio que corre:
Estás em tudo que nasce,
Estás em tudo que morre.
Em tudo estás, nem repousas,
Ó ser tão mesmo e diverso!
(Eras no início das cousas,
Serás no fim do universo.)
Estás na alma e nos sentidos.
Estás no espírito, estás
Na letra, e, os tempos cumpridos,
No céu, nos céu estarás.
Estás em quanto imagino:
Estás no horizonte imenso,
Estás no grão pequenino.
Estás na ovelha que pasce,
Estás no rio que corre:
Estás em tudo que nasce,
Estás em tudo que morre.
Em tudo estás, nem repousas,
Ó ser tão mesmo e diverso!
(Eras no início das cousas,
Serás no fim do universo.)
Estás na alma e nos sentidos.
Estás no espírito, estás
Na letra, e, os tempos cumpridos,
No céu, nos céu estarás.